Assembleia Popular Nacional, a base do sistema político chinês

Deputados representam toda a imensa variedade étnica, social e geográfica da China.

Todos os dias, milhares de turistas e de chineses residentes caminham pela famosa Praça Tian’anmen em Pequim, capital da China. Quem põe os pés nesta impressionante praça fica encantado com suas imensas dimensões.

Os olhos são inevitavelmente atraídos para a Cidade Proibida e para o retrato do Presidente Mao Tsé-tung acima da entrada principal. No entanto, há outro edifício à esquerda que chama a atenção. Com teto plano, uma cornija decorada com telhas de cerâmica amarelas sobre beirais de pétalas verdes de lótus, é uma construção de grande impacto. É este edifício notável que aparece também na frente da nota de 100 yuans. Estamos falando do famoso Grande Palácio do Povo.

O Grande Palácio do Povo foi construído em dez meses, entre outubro de 1958 e agosto de 1959, como uma das “Dez Grandes Construções” da jovem República Popular para marcar o décimo aniversário da sua fundação. Seu conceito arquitetônico reflete de modo marcante a ideia de “servir o povo”. Na entrada principal, no ponto central acima das doze colunas de mármore cinza-claro na frente do edifício, vê-se o resplandecente emblema nacional da República Popular da China.

Ao todo, o edifício ocupa mais de 170 mil m2, com cerca de 300 salas e escritórios. O estilo e o nome de cada uma das salas de reunião refletem as diversas unidades administrativas regionais da China.

O Grande Auditório, a maior sala de todo o complexo, acomoda mais de 10 mil pessoas sentadas. É aqui que são realizados os Congressos Nacionais do Partido Comunista Chinês (PCCh), e também onde a Conferência Consultiva Política do Povo Chinês (CCPPCh) e a Assembleia Popular Nacional (APN) se reúnem uma vez por ano. Durante esses encontros são discutidas as questões políticas e sociais mais importantes do país, e decide-se a respeito de leis e regulamentações importantes.

Funções políticas

O sistema de assembleia popular é a forma organizacional do poder de Estado da China. É o sistema político fundamental do país, baseado na Constituição chinesa promulgada em 1954. Em 1982, no decorrer das reformas de Deng Xiaoping, a Constituição da China foi ampliada e emendada em muitos pontos.

A Constituição de 1982 sustenta que o sistema socialista está ancorado no sistema fundamental do país, que incorpora a modernização socialista como uma tarefa fundamental. Ficou assim estabelecido que seriam consolidadas as realizações de reforma e abertura, que seria instituída uma base constitucional para as futuras reformas políticas e desenvolvimentos, e se faria também um esforço para a consecução dos ideais. Além disso, a constituição da China serve como padrão para as ações de todos os grupos étnicos e organizações do país, atuando como órgãos legislativos máximos para todos os indivíduos e instituições.

Hoje, a APN é o maior corpo parlamentar do mundo. Constitui o mais alto órgão do poder estatal, a sua legislatura máxima e a sua autoridade suprema.

A Assembleia Popular Nacional (APN) é o maior corpo parlamentar do mundo. Constitui o órgão máximo do poder do Estado e, como legislatura de mais alto nível, a suprema autoridade.

Os deputados da APN são eleitos por assembleias populares realizados nas províncias, nas regiões autônomas e nas municipalidades que estão diretamente sob o governo central. As forças armadas elegem também seus deputados. Todos os chineses maiores de dezoito anos têm direito de votar e de concorrer a uma eleição.

Examinando mais de perto a estrutura da APN, impressiona  a proximidade de seus deputados com o povo, que os elegeu e de quem são representantes. Esses numerosos deputados vêm de diversos círculos, de diferentes regiões; são de diferentes nacionalidades e de vários estratos sociais.

Quem tenha visto, pessoalmente ou pela tevê, a entrada dos delegados da APN no Grande Palácio do Povo terá constatado que há representantes de todas as 56 diferentes etnias. A China faz questão de assegurar que no processo de eleição dos delegados para a APN a sua composição seja a mais representativa possível. Todos os grupos sociais e étnicos e organizações da nação têm o direito de enviar delegados a Pequim. Esse princípio está refletido na bem equilibrada proporção entre homens e mulheres, operários e agricultores, funcionários e oficiais, intelectuais e representantes das forças armadas, e, como já mencionado, dá-se muita importância a uma representação equilibrada das minorias étnicas chinesas.

Naturalmente, ao longo dos anos houve várias reformas da lei eleitoral do país. O objetivo tem sido principalmente conseguir uma participação ainda mais justa e harmoniosa de todos os grupos sociais e instituições da nação.

Segundo a Constituição da China, a APN é eleita para um período de cinco anos. No entanto, a regra estabelecida pela Constituição só foi rigorosamente observada a partir do ano de 1978.

A APN exerce o poder legislativo do Estado e decide sobre questões políticas essenciais que dizem respeito ao Estado como um todo. As quatro principais funções e poderes da APN são

• Fazer emendas à Constituição e supervisionar sua aplicação.

• Promulgar e emendar leis básicas referentes a delitos criminais, assuntos civis, órgãos do Estado e outras matérias.

• Eleger e designar membros para os órgãos centrais do Estado.

• Determinar as principais questões do Estado. Isso inclui examinar e aprovar o relatório sobre o plano para o desenvolvimento econômico e social do país e dispor sobre sua implementação, e relatar o orçamento geral, entre outras atribuições.

Faz parte ainda das funções e poderes da APN determinar as fronteiras territoriais dos municípios chineses diretamente sob o governo central, e das regiões autônomas e províncias. Além disso, o estabelecimento de zonas administrativas especiais e de zonas econômicas especiais não pode ocorrer sem a consulta e a aprovação da APN.

A posição dominante da APN dentro do sistema político da China está refletida no fato de que é a APN que toma decisões sobre quem lidera o país e quem chefia os mais altos organismos estatais. Isso inclui, entre outras decisões, definir todos os membros do Comitê Permanente da APN, o presidente da China e seu vice, o primeiro-ministro e seus vices e todos os outros membros do Conselho de Estado.

A APN também decide a composição da Comissão Central Militar, incluindo a nomeação e a exoneração do presidente e do chefe das autoridades judiciárias. Ele tem também a palavra final em decisões sobre assuntos de guerra e paz.

Como é bem sabido, na mídia de alguns países, especialmente do Ocidente, prevalece a noção de que a APN é na realidade apenas um tigre sem dentes, um parlamento sem funções importantes, que meramente dá anuência às decisões dos líderes de Estado. No entanto, examinando mais de perto a extensão dos poderes constitucionalmente garantidos, como mencionado acima, fica evidente que essa suposição tem pouco a ver com a realidade atual da China.

Durante as sessões da APN, todos os seus representantes têm garantido o direito  irrestrito de expressar abertamente seus pontos de vista em público e de apresentar propostas e moções ao governo e às autoridades a ele subordinadas. Portanto, não é incomum que tenham lugar debates acirrados e controversos, e não é de modo algum garantido que todas as contribuições e propostas apresentadas à APN pelas lideranças do Estado sejam aprovadas inteiramente sem mudanças.

Outro cenário para animadas discussões e críticas a respeito do trabalho do governo é o das sessões de grupo das 35 delegações da APN. No entanto, mesmo durante as sessões plenárias anuais, onde, entre outros assuntos, são discutidos, aceitos ou rejeitados o relatório anual do governo e os relatórios de outros organismos estatais, não é incomum assistir a abertas diferenças de opinião.

Todo ano as sessões atraem a atenção do público chinês e do exterior. Nem todas as sessões da APN são realizadas a portas fechadas. Ao contrário, como a APN está comprometida com total transparência, jornalistas de rádio e tevê assim como representantes da mídia impressa são convidados a participar desses eventos políticos, do início ao fim. Todos fazem reportagens ao vivo, abertas e não tendenciosas sobre as sessões diárias que ocorrem no Grande Palácio do Povo.

O canal de tevê internacional China Global Television Network, assim como a sua rádio internacional CRI, também fazem reportagens ao vivo, diárias, no local, em várias línguas, para uma audiência global, a respeito de eventos na APN.

O destaque anual com certeza é a transmissão ao vivo, pela Televisão Central da China, da colorida entrada de todos os delegados da APN. Jornalistas da mídia internacional e dos canais chineses CCTV e CRI esforçam-se para responder às perguntas feitas por audiências do exterior, e para explicar claramente esses eventos políticos.

Sistema multipartidário

Outro componente importante e fundamental do sistema político da China, além dos das assembleias populares, é o sistema de cooperação multipartidária e as consultas políticas sob a liderança do PCCh.

Além do Partido Comunista, existem na China oito outros partidos, chamados de partidos democráticos, cujas origens remontam à Guerra
de Libertação do Povo Chinês e à Guerra de Resistência Contra a Agressão Japonesa.

Muitas pessoas no mundo ocidental não têm conhecimento do fato de que, além do Partido Comunista Chinês, existem oito outros partidos políticos na China, os chamados partidos democráticos. A Constituição chinesa garante seu status legal e sua independência organizacional.

A origem da maioria desses partidos data do período da Guerra de Libertação do Povo Chinês e da Guerra de Resistência Contra a Agressão Japonesa. Em geral, pode-se dizer que esses partidos reconhecem o papel principal do PCCh e dão apoio firme ao Partido Comunista. A política básica e os princípios que dizem respeito à cooperação entre todos os partidos políticos chineses podem ser resumidos na seguinte frase: “Coexistência de longo prazo e mútua supervisão, tratamento mútuo com total sinceridade e compartilhamento em todas as situações”.

Assim, os partidos democráticos são uma parte inextricável do sistema político da China, e um poder que contribui para governar o país. A cooperação entre esses diferentes partidos e grupos se dá na Comissão Nacional da CCPPCh.

A CCPPCh consiste não apenas dos representantes do Partido Comunista da China e dos partidos democráticos, mas também dos especialistas e representantes não partidários das minorias étnicas, das organizações de massa do país, dos representantes especiais das regiões administrativas especiais de Hong Kong e Macau, e de Taiwan.

A sessão plenária da Comissão Nacional da CCPPCh tem lugar uma vez ao ano, em geral ao mesmo tempo em que se realizam as sessões da APN. A agenda inclui políticas de Estado e tópicos fundamentais que afetam a vida do povo. Como um corpo estatal, a Comissão Nacional desempenha a função de supervisionar o trabalho de outros corpos estatais e de verificar a observância das normas constitucionais e leis da China. A CCPPCh desempenha assim papel-chave dentro do sistema legal chinês.

Além disso, membros da CCPPCh com frequência são também convidados a participar da sessão da APN como delegados sem direito a voto, toda vez que questões e discussões importantes fazem parte da agenda.

Desenvolvimento histórico

A China fundou a APN há quase 63 anos, em setembro de 1954. Mas mesmo décadas antes, sob o governo Beiyang que comandou o país entre 1912 e 1928, houve grandes esforços para implementar o princípio político da separação dos poderes.

No entanto, após a fundação da República Popular da China, o novo governo percebeu que a separação dos poderes legislativo, executivo e judiciário, como praticada na maioria dos países do Ocidente, não seria adequada à China. Em vez disso, o país decidiu criar o sistema de assembleia popular.

Esse sistema foi desde então revisto e melhorado várias vezes ao longo dos anos. Em 2012, por exemplo, decidiu-se determinar o número de representantes de áreas urbanas e rurais proporcionalmente a suas respectivas populações.

Além disso, foi acelerado o estabelecimento de eleições diretas em nível de distrito e município. Ao mesmo tempo que eram implantadas reformas e restruturações no partido e nas lideranças do Estado, eram lançados projetos-piloto para a abolição do sistema de serviço público vitalício, e implantou-se então o princípio da rotatividade dos servidores públicos em organismos governamentais ou administrativos.

A estrutura e a formação da APN também experimentaram várias reformas e aprimoramentos ao longo dos anos, com o objetivo de refletir com maior precisão a vontade e as demandas do povo chinês em toda a sua diversidade. A complexidade de um empreendimento desse tipo fica evidente quando temos em mente que a China é um país com um vasto território, onde vivem pessoas de muitas etnias, línguas e culturas diferentes.

Visto por este ângulo, o sistema de assembleia popular, assim como a forma de eleição dos delegados, tem se mostrado sem dúvida, ao longo das décadas desde a fundação da República Popular, uma forma de governo perfeitamente democrática. A APN e a CCPPCh supervisionam a conformidade do país com o Estado de direito.

A liderança política do PCCh é inquestionável. Mesmo assim, os delegados da APN e os membros da CCPPCh têm direito de criticar as decisões do partido e de exigir aprimoramentos toda vez que quaisquer dúvidas se manifestem.

Há bem pouco tempo, na recepção de Ano Novo da Comissão Nacional da CCPPCh, o presidente chinês Xi Jinping pediu que as instituições democráticas da APN e da CCPPCh  aprofundassem seu envolvimento no processo de tomada de decisões políticas, e que “sinceramente cumprissem suas funções de monitoramento democrático e participação nos assuntos de Estado”.

Xi considerou 2017 um ano crucial, não só pela realização do 19o Congresso Nacional do PCCh, mas porque “o 13o Plano Quinquenal irá avançar em sua implementação e as reformas paralelas serão aprofundadas”.

O atual desenvolvimento da China mostra que o país escolheu o caminho certo ao instituir a representação democrática de todo o povo chinês, independentemente de sua origem étnica e cultural. Mesmo assim, como sempre, ainda há espaço para introduzir melhorias.

No todo, porém, o sistema da APN, de mãos dadas com a CCPPCh, mostra-se eminentemente adequado como sistema que permite a representação do povo chinês, ouve e cuida de suas vontades e ideias, e as coloca em prática dentro da estrutura legislativa.

Portanto, desejo aos delegados da APN e aos membros da CCPPCh o maior sucesso possível e resultados positivos em suas sessões de 2017!

HELMUT MATT é escritor e sinólogo, radicado na Alemanha.

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