Sem tempo a perder: Desenvolvendo novas maneiras de transformar lixo em tesouro

Por Ma Miaomiao

Para onde vai o nosso lixo? Devemos depositá-lo apenas em aterros ou incinerá-lo? Restos de cozinha podem ser transformados em adubo? Quando vemos caminhões de lixo transportando cargas e mais cargas, essas perguntas talvez estejam na mente de todos.

Na verdade, vivemos rodeados de produtos feitos a partir de resíduos sólidos – a eletricidade, o biogás e o gás natural que usamos todos os dias podem ser feitos a partir do lixo, de acordo com Zhao Guohong, vice-secretário do Comitê do Partido Comunista da China para o Grupo Nacional de Proteção Ambiental da China. Zhao também faz parte do conselho de administração do grupo, uma subsidiária da empresa multinacional estatal China Energy Conservation and Environmental Protection Group.

A gestão de resíduos sólidos virou um grande negócio na China, à medida que o país enfrenta o problema do aumento do lixo urbano. Du Xiangwan, membro da Academia Chinesa de Engenharia, disse à agência de notícias Xinhua que até 2030 o valor dos produtos da classificação de resíduos sólidos e da utilização de recursos da China chegará a 8 trilhões de yuans (US$ 1,12 trilhão), permitindo criar de 40 milhões a 50 milhões de empregos.

Guardar o lixo – Como segundo país mais populoso do mundo, a China enfrenta um grande desafio, pois gera todo ano mais de 10 bilhões de toneladas de resíduos sólidos industriais, agrícolas e domésticos, segundo dados divulgados pelo Ministério da Ecologia e Meio Ambiente em janeiro.

Embora geralmente visto como uma fonte de poluição, o lixo também pode ser um recurso eficaz, disse Jin Yong, professor de engenharia química do Instituto de Economia Circular da Universidade Tsinghua, ao jornal China Daily. Ao adotar uma abordagem de economia circular à gestão de resíduos, com a redução, reutilização ou reciclagem do lixo (os 3Rs), as pessoas podem passar a ver o lixo não como um fardo, mas como um recurso potencial à espera de ser aprovei tado. Ele acrescentou que essa mudança de perspectiva abriu oportunidades para extrair valor dos resíduos e reduzir a pressão sobre os recursos naturais.

A China avançou na reciclagem abrangente de resíduos sólidos, incluindo a classificação, recuperação e reutilização de componentes de resíduos sólidos com possível valor econômico, segundo uma taxa geral de reciclagem de 59% no ano passado, declarou Jin, acrescentando que uma conquista notável é a reciclagem de resíduos de aço, cujo volume representa um quarto da produção total de aço bruto do país.

O tratamento de resíduos domésticos da China também está se desenvolvendo numa direção mais adequada a melhorar o ambiente de vida e permitir a criação de benefícios econômicos. Um exemplo, segundo Zhao, são as empresas desse setor que coletam resíduos domésticos de áreas designadas e em seguida incineram os materiais não recicláveis para gerar eletricidade para uso urbano. Alguns resíduos de cozinha, como cascas de frutas, são difíceis de queimar completamente se enviados diretamente ao incinerador. Por isso, são colocados primeiro num tanque para fermentar e desidratar e só depois vão para um forno para serem queimados.

A temperatura dentro do forno é mantida acima de 850 graus Celsius e os dados de fumaça são monitorados online para garantir o controle da poluição. A fumaça, cinzas e águas residuais resultantes são adequadamente descartadas para evitar a poluição secundária, acrescentou.

Em junho de 2022, nove departamentos, incluindo a Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma e a Administração Nacional de Energia,  emitiram um plano de desenvolvimento de energia renovável segundo o qual a China desenvolverá constantemente usinas de incineração de resíduos domésticos urbanos para gerar energia.

O Projeto Resíduos Urbanos para Energia utiliza um modelo de concessão para a construção de usinas de queima de resíduos sólidos urbanos para a geração de energia elétrica. As usinas empregam tecnologia limpa que não re- quer queima adicional de combustíveis fósseis e atende aos mais altos padrões internacionais de emissões.

Mais verde e mais limpo – Na China, mais de 99% dos resíduos urbanos são agora coletados e cerca de metade acaba em incineradores, enquanto o restante é despejado em aterros. Isso, por sua vez, criou problemas de contaminação do solo e das águas subterrâneas e de escassez de terras. Zhao sugere intensificar a pesquisa e desenvolvimento para reduzir o im- pacto ambiental dos aterros sanitários. Também disse que são esperadas mais políticas para regular a indústria de reciclagem de resíduos.

Em fevereiro, o Conselho de Estado, mais alto órgão administrativo estatal da China, divulgou uma diretriz delineando metas e medidas para avançar no sistema de reciclagem de resíduos e consolidar a base verde e de baixo carbono para que o país alcance um desenvolvimento de alta qualidade.

A China implementará uma série de políticas para promover um sistema abrangente de reciclagem de resíduos que cubra todos os setores e estágios até 2025, e a indústria de reciclagem de recursos deverá alcançar um valor de produção anual de 5 trilhões de yuans (US$ 697 bilhões), de acordo com o documento. Até 2030, o país terá implantado um sistema de reciclagem de resíduos abrangente, eficiente e simplificado, e o nível geral de reciclagem de resíduos estará entre os mais elevados do mundo.

A diretriz enfatiza a adoção do conceito de economia circular de 3Rs, a fim de melhorar a eficiência da utilização de recursos por meio de uma gestão direcionada, uma reciclagem eficaz e utilização eficiente de resíduos.

Consertando coisas – Zhao deu ainda à Beijing Review explicações adicionais sobre a cadeia industrial do setor de gestão de resíduos sólidos da China.

Segundo ele, o ponto de partida é a fabricação de equipamentos para tratamento de resíduos sólidos, como incineradores de resíduos sólidos e de gases residuais. Os estágios intermediários envolvem coleta, triagem e transporte de resíduos sólidos. Os estágios subsequentes con- sistem no tratamento e descarte, e essas abordagens devem ser respeitadoras do ambiente e baseadas em recursos.

“A triagem de lixo pode impulsionar o aprimoramento de toda a cadeia de gerenciamento de resíduos”, disse Liu Jianguo, professor de gestão de resíduos sólidos na Escola de Meio Ambiente da Universidade Tsinghua. “Quando o lixo doméstico é categorizado, os resíduos de cozinha podem ser processados por meio de tecnologia de compostagem, e grande parte dos recursos pode ser reciclada sem estar misturada a itens biodegradáveis.”

“Estamos tentando especificamente reciclar resíduos orgânicos de cozinha. Depois que esse resíduo é coletado, nós o fermentamos para produzir biogás para geração de eletricidade”, disse Zhao, acrescentando que o resíduo pode ainda ser usado como forragem ou fertilizante.

A empresa em que Zhao trabalha conduz atualmente mais de 20 projetos desse tipo em todo o país, na tentativa de reciclar ainda mais resíduos de cozinha, declarou. No entanto, problemas como instalações inadequadas de descarte de resíduos e falta de tecnologia atualizada continuam causando problemas ao setor, e são necessárias mais medidas para melhorar a coordenação e promover a atualização e expansão, acrescentou Zhao.

Por exemplo, conforme estipulado por regulamentações pertinentes, cada 2 mil domicílios em áreas urbanas devem ter um centro de reciclagem. Nos municípios rurais, deveria haver um centro desse tipo para cada 2.500 domicílios. No entanto, a distribuição atual de centros de reciclagem na China, concentrados principalmente em áreas urbanas, fica aquém da cobertura desejada, disse Xu Junxiang, presidente da Associação Nacional de Reciclagem de Recursos da China, ao China Daily.

Além disso, mais de 80% das empresas envolvidas na reciclagem de recursos são pequenas ou médias. Capacidade financeira limitada e restrições técni-
cas impedem inovações que poderiam melhorar a eficiência da reciclagem de recursos, disse Zhao. É preciso canalizar mais investimentos para melhorar a infraestrutura e as instalações de gerenciamento de resíduos, incluindo a criação de mais centros de reciclagem, a atualização dos equipamentos de triagem e processamento e a expansão das capacidades de transporte e armazenamento, sugeriu Xu.

Para incentivar o investimento em infraestrutura e tecnologia de reciclagem, deve-se oferecer maior apoio financeiro às empresas e projetos, na forma de verbas, subsídios e empréstimos a juros baixos, e as empresas que demonstrem práticas de reciclagem sustentáveis e eficientes devem receber incentivos fiscais, acrescentou.

 

Este texto foi publicado originalmente na revista China Hoje. Clique aqui, inscreva-se na nossa comunidade, receba gratuitamente uma assinatura digital e tenha acesso ao conteúdo completo.

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