Música suave, o aroma característico de livros novos, pessoas examinando os diversos corredores, esperando que das estantes de livros salte aos olhos alguma coisa especial. Com frequência, são tantas as opções que nem sabemos o que levar. Portanto, a solução é relaxar em algum sofá e pedir um cappuccino ou um chá enquanto decidimos. E se por acaso houver um salão literário acontecendo, podemos até encontrar algum grande ícone cultural.
O prazer de escolher, ler e comprar em livrarias não tem como ser superado pelos e-books ou pelas compras pela internet. Na China, há muitas livrarias independentes que oferecem o prazer da leitura. Confrontadas com a concorrência das vendas pela internet e dos e-books, essas lojas estão procurando sua própria forma de se desenvolver.
Marcos culturais
A Sanwei Bookstore foi a primeira livraria de operação privada a abrir em Pequim. Sua fachada parece pequena na longa avenida Chang’an que corta o centro de Pequim de leste a oeste. Na entrada, uma parede inteira é coberta com post-its onde os frequentadores podem deixar suas mensagens e desejos. Entre eles está o autógrafo do falecido Israel Epstein, antigo editor honorário da China Today. Na parede oposta, há uma lista das palestras literárias e culturais que já foram realizadas na livraria.
A Sanwei não vende literatura popular ou best-sellers. O senhor Li, o dono, explica a ideia da sua livraria. “Aqui, os livros são escolhidos a dedo. Selecionamos aqueles que fazem você pensar. A qualidade de um livro é reflexo da personalidade do autor, portanto esse é o nosso primeiro requisito. Temos os clientes habituais, mas também os jovens, que são atraídos pela reputação de nossa instituição.” Em contraste com o turbulento mundo lá fora, o interior da livraria é tranquilo. Até a música é suave, para não perturbar os leitores.
Falando sobre o futuro desta livraria tradicional, Li declarou: “Livros e mídia impressa nunca irão desaparecer e nem serão substituídos por livros digitais ou pela internet. A maioria dos donos de livrarias tradicionais quer apenas vender livros. Mas, enfrentar a pesada pressão do mercado e os aluguéis exorbitantes, torna cada vez mais difícil a sobrevivência das lojas independentes. Temos a sorte de ter nosso próprio edifício, o que nos permite manter o negócio. Aqui todos os livros são vendidos pelo preço integral, não há descontos ou cartões de fidelidade”.
Desde a década de 1990, os sites de vendas de livros pela internet como a Amazon e a Dangdang tiveram um grande crescimento e agora dividem o mercado com as livrarias tradicionais. A facilidade e os preços atraentes dessas lojas online constituem um imenso desafio para as livrarias tradicionais. Com a popularidade das compras online, dos e-books e das leituras em computador, e com o aumento dos custos dos aluguéis, as livrarias tradicionais estão em baixa. No final de outubro de 2011, a O2 Sun Bookstore fechou as portas por razões financeiras. Era a maior livraria independente da China, com uma história de 16 anos. Livrarias como The Third Pole, Monsoon e Fengrusong fecharam também, uma após a outra. Em 2015, livros vendidos online registraram mais um recorde de crescimento, com um aumento de 33% de um ano para o outro. JD, Tmall e Dangdang são os três sites de vendas de livros mais bem-sucedidos.
No entanto, as livrarias sobreviventes acabaram aos poucos virando marcos culturais das cidades da China, como a Sanwei Bookstore em Pequim, a Zhongshuge em Xangai, a Librairie Avant-Garde em Nanquim, a Sisyphe Bookstore em Guizhou e a Xiaofeng Bookstore em Hangzhou.
Em novembro de 2014, durante sua inspeção do Grande Canal de Pequim-Hangzhou, o primeiro-ministro chinês Li Keqiang visitou a Xiaofeng em Hangzhou. “As livrarias tradicionais foram desafiadas pela internet, mas livros em papel são símbolos de cultura e sempre terão seu lugar no mercado”, disse Li.
Harmonia com a cidade
A Zhengyang Bookstore sem dúvida tem o mais autêntico sabor de Pequim. Ela oferece milhares de livros sobre a história de Pequim, sua cultura e seu folclore e artes, livros usados como os Annals of Miyun County e The Historical Narrative of Quanjude, e livros novos, como Disappearing Hutong. Não falta nada. O acervo foi cuidadosamente selecionado por Cui Yong, o livreiro, nascido na década de 1980. Uma escultura do deus-coelho de Pequim e bules de chá em estilo local podem ser encontrados em uma prateleira no canto. Entre os frequentadores há pesquisadores e aficionados pela história de Pequim. Esses clientes regulares, que acabaram ficando amigos do livreiro, têm permissão para pegar livros emprestados.
Em abril de 2009, Cui Yong abriu a livraria, apesar da oposição da família. A loja ficava antes no número 76 da Langfang’ertiao, distrito de Xicheng. Mas no final de 2013, o Comitê Cultural do Distrito de Xicheng entrou em contato com Cui Yong e ofereceu-lhe um novo local no pátio em volta do Pagode do Velho Homem Wansong, uma boa maneira de mostrar a herança cultural e histórica de Pequim. A livraria, que tem foco na história de Pequim, está em perfeita harmonia com esse local histórico. Hoje, o pátio é um local de leitura operado pela Zhengyang Bookstore. “Eu abri essa livraria por um interesse meu, pessoal. Hoje, todas as livrarias tradicionais estão enfrentando dificuldades. Nós tivemos a sorte de o governo nos disponibilizar este local de graça, o que reduziu muito nossos custos”, disse Cui Yong.
No ano passado, as livrarias independentes da França e do Canadá se recuperaram graças ao apoio do público e do governo. Na China, como nesses dois países, as dificuldades das livrarias atraíram a atenção do público. O governo lançou políticas e soluções para dar apoio aos vendedores de livros. Desde 2013, o Ministério das Finanças e a Administração Estatal da Imprensa, Indústria Editorial, Rádio, Cinema e Televisão iniciaram projetos-piloto para apoiar as livrarias. Em 2014, começou o trabalho em 12 cidades, incluindo Pequim, Xangai, Nanquim e Hangzhou, com 56 lojas recebendo um total de 90 milhões de yuans em apoio financeiro.
Em 2015, o trabalho piloto de apoio a livrarias em instalações de alvenaria expandiu-se para 16 cidades e províncias. Em janeiro de 2016, foi realizado em Pequim o Seminário de Análise do Mercado de Livros de 2015. Segundo o seu relatório, o mercado varejista de livros da China em 2015 cresceu 12,8% em relação ao ano anterior. O mercado de livrarias independentes continuou crescendo em 2015 depois de ter crescido 3,26% em 2014.
Pensamento diversificado
Além das livrarias que defendem fortemente a tradição ou têm um nicho de mercado, mais e mais livrarias estão escolhendo inovar e diversificar seu modo de operação.
A Owspace é uma rede de livrarias independente, antes conhecida como One Way Street. Fundada em 2006, ela derivou seu nome do livro homônimo do filósofo alemão Walter Benjamin. Xu Zhiyuan, fundador dessa livraria, é um escritor conhecido. Sua primeira intenção era criar um espaço de leitura para ele e os amigos. O endereço original da livraria era perto do antigo Palácio de Verão, na parte noroeste de Pequim. Tendo a Universidade de Pequim e a Universidade Tsinghua vizinhas, seus clientes incluíam muitos estudantes. Em 2009, a One Way Street mudou-se para o distrito de compras de Solana, pressionada por aluguéis muito caros no bairro das universidades. Em 2012, a loja se mudou de novo, desta vez para o shopping Chaoyang Joy City, também por razões financeiras, e outra filial foi aberta naquele ano no centro comercial Aegean de Pequim.
Após anos de mudanças, a livraria alterou seu nome para Owspace. Ao mesmo tempo, diversificou seus métodos financeiros, expandindo seus canais de venda e diversificando seus produtos. Em janeiro de 2014, na Terceira Cúpula das Livrarias Independentes da China, Wu Yanping, diretor de operações da livraria, atribuiu o sucesso da Owspace ao seu pensamento inovador e multidirecional.
A Owspace está localizada no terceiro andar do Centro Comercial Aegean Mall. Paredes brancas e madeira combinam bem com o estilo do lugar. As prateleiras são embutidas nas paredes. Há poltronas para sentar e ler, e vários produtos comerciais à venda, como notebooks, pincéis de caligrafia e calendários. Na cafeteria, as pessoas ficam absortas lendo e sentindo o aroma de café. Também são realizados encontros culturais nos fins de semana.
Conversamos aqui com a senhorita Cheng, uma bacharel do Departamento de História da Universidade de Pequim, que está no processo de selecionar livros. Ela fala da Owspace como de uma velha amiga. “Quando a loja era perto da minha universidade, eu ia lá bastante. Tinha até um pátio pequeno onde exibiam filmes ao ar livre. Convidados especiais debatiam com os leitores ali, era ótimo! E todas as atividades eram de graça. Não havia obrigação de pedir um café ou de comprar um livro. As pessoas escreviam bilhetes para agradecer ao livreiro. As pessoas vêm movidas pela curiosidade e saem com algum livro comprado. Não acho que as livrarias tradicionais irão desaparecer. Ao contrário, cada vez mais pessoas estão voltando a frequentá-las.”
Na entrada da livraria, há um “canto para contemplação” onde a pessoa pode ficar lendo, estudando ou descansando. O senhor Wang está se preparando para uma entrevista para iniciar um doutorado em ciências. “Este lugar é perto de casa, a atmosfera é agradável e é de graça. Então venho aqui com frequência para estudar e ler. Às vezes, compro algum livro. Mas a maior parte dos livros daqui são sobre literatura, história e filosofia; são raros os livros sobre ciências”, diz ele.
Tirando partido das novas mídias, a loja também desenvolveu dois aplicativos que ajudam os leitores a encontrar recomendações de artigos, vídeos e outras informações. Ao usar a popular plataforma app, a Owspace oferece aos seus leitores conteúdo de qualidade em pequenas porções, que combinam melhor com o ritmo rápido da vida moderna.
Hoje, um número crescente de livrarias independentes está seguindo o modelo criado pela Owspace; elas desenvolvem produtos culturais e criativos, combinando-os com a internet e as novas mídias. Neste tipo de livraria, podemos ler e ao mesmo tempo curtir um momento de descanso, encontrar amigos ou participar de um salão cultural. Livrarias independentes criaram um novo estilo de vida.
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