A 10ª Cúpula do BRICS, em Joanesburgo, iniciou-se com a responsabilidade de afirmar o compromisso dos cinco países na defesa do multilateralismo comercial e da democratização do sistema internacional diante da ameaça da expansão do protecionismo comercial e do unilateralismo em razão da “guerra comercial” iniciada pelos EUA. Esta “guerra comercial” terá reflexos negativos sobre o crescimento da economia mundial e imporá maiores dificuldades aos países em desenvolvimento. Além disso, ela enfraquece a OMC, aprofundando ainda mais a crise de eficácia e legitimidade da organização desde a inconclusa Rodada Doha iniciada em 2001.
Medidas unilaterais que provocam danos generalizados a vários países podem perder a sua característica de “medida de proteção” do mercado e dos empregos domésticos para se revelar em um tipo de “ato de agressão” contra os mercados e empregos de outros países. A OMC foi criada exatamente para ser o arcabouço institucional-normativo de referência que determina os limites de ação dos Estados no comércio internacional de modo a promover uma “competição” e não uma “guerra” comercial entre eles.
Diante deste contexto, é necessário que os países do BRICS desmontem as armadilhas da retórica unilateralista e das medidas protecionistas dos EUA por meio da enfática defesa do sistema multilateral do comércio da OMC e do incremento do comércio intra-BRICS. E, neste quesito, ainda há muito a ser feito. A China é o único país que mantém relações bilaterais comerciais substantivas com cada um dos demais quatro países do BRICS.
Discute-se se o aprofundamento do comércio intra-BRICS deve ser acompanhado do alargamento do BRICS. Na Cúpula do ano passado, em Xiamen (China), o governo chinês propôs a ampliação do grupo de forma a admitir outras economias emergentes. Esta proposta ficou conhecida como “BRICS-Plus”. Relatórios do Banco Mundial já vem demonstrando a tendência de maior participação dos países em desenvolvimento na economia mundial. Tem-se assim, dois movimentos importantes a serem considerados pelo BRICS: de um lado, o aprofundamento vertical das relações comerciais intra-BRICS e, de outro, o alargamento horizontal de modo a admitir novos membros, promovendo a democratização do sistema internacional e maior liberalização do comércio. Quanto a este último movimento, é preciso, contudo, que o alargamento tenha em conta certos critérios, dentre eles, a manutenção da agenda em defesa da reforma de algumas organizações internacionais. E, neste quesito, além do Banco Mundial, do FMI e das Nações Unidas, a OMC talvez deva ser incluída no rol das instituições internacionais que precisam ser reformadas.
Mas paralelo ao propósito reformista, os países do BRICS poderiam promover iniciativas concretas que fortaleçam o comércio internacional. A China dá o exemplo este ano. Nos dias 5 a 10 de novembro o governo chinês promoverá a primeira “China International Import Expo (CIEE)”, em Shanghai. O país que ficou conhecido como a nação exportadora, agora quer comprar bens e serviços estrangeiros para suprir a crescente demanda doméstica por mais e melhores produtos. Este evento, que contará com mais de 100 países e regiões, é um exemplo de iniciativa que favorece a promoção do comércio internacional. O Conselho Empresarial dos BRICS poderia ter um papel mais ativo na Expo e, também, planejar outras iniciativas semelhantes para o futuro.
Por meio de iniciativas concretas, o BRICS tem a oportunidade de reagir positivamente ao unilateralismo e ao protecionismo, sem se deixar paralisar diante dos atuais obstáculos. Ao contrário do que se pode supor, este atual momento, apesar dos obstáculos da conjuntura internacional, é uma grande oportunidade para o BRICS mostrar o seu compromisso com a construção de uma comunidade de destino comum da humanidade.
Evandro Menezes de Carvalho
Editor Executivo Chefe da revista China Hoje. Coordenador do Núcleo de Estudos Brasil-China da FGV e do Centro de Estudos dos Países BRICS da UFF.
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