ATRAVESSANDO JUNTOS PELO VENTO E A CHUVA, A CONSTRUÇÃO DE UMA COMUNIDADE DE FUTURO COMPARTILHADO CHINA-AMÉRICA LATINA: A PRÁTICA E AS PERSPECTIVAS FUTURAS

A cooperação entre China e Chile
I. Relações China-Chile na história

Historicamente, a relação entre a China e a América Latinaincluindo o Chilefoi mínima, caracterizada por contatos esporádicos e uma influência limitada devido às vastas distâncias geográficas e aos diferentes cenários políticos. No entrando, nas últimas décadas, essa dinâmica mudou drasticamente. O final do século XX e o início do século XXI presenciaram uma rápida aceleração nas relações entre a China e a América Latina, transformando-se de contatos insignificantes para parcerias econômicas e políticas substanciais.

Essa transformação ilustrada de forma vívida pelo crescimento exponencial nos volumes comerciais, compromissos diplomáticos e acordos abrangentes entre a China e os países latino-americanos, particularmente o Chile. Em 1970, o Chile se tornou a primeira nação sul-americana a estabelecer relações diplomáticas formais com a República Popular da China, o que lançou as bases para uma cooperação futura. A relação se aprofundou significativamente com a assinatura de um histórico acordo de livre comércio (TLC) em 2005, o primeiro TLC que a China assinou com um país latino-americano. Esse acordo catalisou um aumento no comércio bilateral, com o volume total de comércio entre a China e o Chile passando de aproximadamente US$ 8 bilhões em 2005 para mais de US$ 40 bilhões em 2021. Desde então, a China se tornou o maior parceiro comercial do Chile, representando uma partesignificativa das exportações chilenas, especialmente decobre e produtos agrícolas. As visitas de Estado de alto nível consolidaram ainda mais essa parceria. O presidente chinês,Xi Jinping, visitou a América Latina em várias ocasiões desde que assumiu o cargo, e os presidentes chilenos realizaram visitas recíprocas a Pequim. Esses compromissos ampliaram a cooperação para além do comércio, incluindo o desenvolvimento de infraestrutura, a colaboração tecnológica e os intercâmbios culturais, refletindo uma parceria abrangente e estratégica que contrasta fortemente com as interações mínimas do passado.

A cooperação bem sucedida entre a China e o Chile constitui um exemplo de como as relações bilaterais podem promover o desenvolvimento e aprofundar os intercâmbios multifacetados através de interesses comuns.

II. Cooperação amigável China-Chile

A relação entre a China e o Chile evoluiu significativamente nas últimas cinco décadas, transformando-se de um contato mínimo para uma parceria abrangente e multifacetada. Embora grande parte do foco acadêmico tenha sido nos aspectos econômicos –particularmente no comércio e nos investimentos a profundidade das relações entre a China e o Chile vai muito além da economia. Essa relação bilateral abrange colaboração diplomática, intercâmbios culturais, inovação tecnológica e os esforços conjuntos para enfrentar os desafios globais. O sucesso da cooperação entre a China e o Chile é um exemplo convincente de como as nações podem aproveitar interesses mútuos para promover o desenvolvimento e fortalecer os laços em múltiplos âmbitos.

Os laços econômicos entre a China e o Chile tornaram-se a pedra angular de sua relação, marcados por marcos significativos e benefícios tangíveis para ambos os países. Em 2005, o Chile se tornou o primeiro país latino-americano a assinar um TLC com a China. Esse acordo histórico catalisou um aumento no comércio bilateral, com o volume total de comércio aumentando de aproximadamente US$ 8 bilhões em 2005 para mais de US$ 42 bilhões em 2018. O sucesso do TLC impulsionou ambas as nações a negociar uma versão ampliada, que entrou em vigor em 1º de março de 2019. Esse acordo atualizado eliminou ainda mais as tarifas sobre uma ampla gama de produtos, melhorando o acesso ao mercado e facilitando uma maior cooperação econômica.

O impacto do TLC e sua expansão são evidentes na diversificação e crescimento das exportações chilenas para a China. Embora o cobre continue sendo uma exportação significativa – representando aproximadamente 76% das exportações do Chile para a China em 2018 -, houve um aumento notável nos produtos agrícolas e industriais. O setor agrícola, em particular, experimentou um crescimento expressivo. Após a eliminação completa das tarifas em 2015, as exportações de vinho chileno para a China aumentaram substancialmente. Em 2018, a China se tornou o maior mercado para as exportações de vinho chileno, totalizando US$ 254 milhões, fazendo do Chile o terceiro maior exportador de vinho para a China, depois da França e da Austrália. A exportação de cerejas frescas exemplifica o crescimento dinâmico do comércio agrícola. Em 2018, o Chile exportou mais de 139 mil toneladas de cerejas para a China, avaliadas em US$ 430 milhões, o que representou umaumento de 126% em relação ao ano anterior. A China agora é responde por quase 75% do total de exportações de cerejas do Chile. Da mesma forma, as exportações de salmãochileno para a China aumentaram significativamente desde a redução das tarifas sob o TLC, passando de US$ 23 milhões em 2010 para US$ 176 milhões em 2018.

Esses sucessos são atribuídos não apenas às reduções tarifárias, mas também aos esforços estratégicos de marketing e à colaboração entre os setores público e privado. Iniciativas como a “Semana do Chile” em Pequim e Xangai, organizadas pela ProChile e pela Associação Chilena de Exportadores de Frutas (Asoex), promoveram produtos chilenos no mercado chinês. Uma campanha de marketing de US$ 5 milhões para as cerejas chilenas na China levou a um aumento significativo na demanda, demonstrando a eficácia desses esforços de colaborativos.

Além disso, os investimentos chineses no Chile cresceram além do foco tradicional na mineração. Embora os investimentos iniciais da China estivessem concentrados em garantir cobre e outros minerais, nos últimos anos, houve uma diversificação para setores como energia, infraestrutura e tecnologia. Exemplos notáveis incluem projetos de desenvolvimento de infraestrutura, como a represa LasPalmas. A China Harbour Engineering Company se tornou aprimeira empresa chinesa a vencer uma licitação pública no Chile, assumindo a construção desse projeto de US$ 171 milhões, destinado a melhorar a irrigação e o fornecimento de água no vale de Petorca.

Nas telecomunicações, a Huawei tem sido fundamental na melhoria da infraestrutura digital do Chile, através de iniciativas como o Projeto de Fibra Óptica do Sul, investindo US$ 91 milhões para melhorar a conectividade nas regiões sul de Los Lagos, Aysén e Magallanes. Além disso, a empresa chinesa Tianqi Lithium adquiriu uma participação de 24% na mineradora chilena SQM por US$ 4,1 bilhões em 2018, sinalizando o interesse da China nos abundantes recursos de lítio do Chile, vitais para a tecnologia de baterias e energia renovável. Esses investimentos refletem uma estratégia mais ampla de benefício mútuo. O Chile se beneficia de entrada de capital, transferência de tecnologia e melhorias em infraestrutura, enquanto a China garante acesso a recursos essenciais e expande sua presença na América Latina.

Política e diplomacia

Na âmbito diplomático e político, a China e o Chile aprofundaram significativamente suas interações, solidificando a relação e elevando-a ao nível de uma parceria estratégica abrangente. Essa evolução reflete um compromisso mútuo de fortalecer os laços e colaborar em questões globais e regionais.

Ao longo dos anos, as visitas de alto nível e intercâmbios diplomáticos desempenharam um papel crucial no avanço das relações bilaterais. Notavelmente, o intercâmbio de visitas presidenciais foi instrumental para fomentar o entendimento mútuo e delinear objetivos estratégicos.

Em 2016, o Presidente Xi Jinping fez uma visita de Estado ao Chile. Durante essa visita, China e Chile elevaram sua relação ao nível de parceria estratégica abrangente, simbolizando um nível mais profundo de confiança e cooperação.

Em 2014, a visita de Estado à China pela presidente chilena Michelle Bachelet resultou na assinatura de vários acordos em educação, ciência e tecnologia e mineração. Em 2018, Chile e China assinaram um memorando de entendimento sobre a Iniciativa do Cinturão e Rota (ICR), tornando o Chile um dos primeiros países latino-americanos a aderir formalmente a essa iniciativa.

Os intercâmbios legislativos fortaleceram ainda mais o entendimento mútuo e a colaboração. Delegações parlamentares de ambos os países participaram de diálogos para compartilhar experiências legislativas e promover a cooperação em marcos legais que facilitassem iniciativas bilaterais. Em 2018, o presidente do Senado chileno, Carlos Montes, liderou uma delegação à China para discutir a cooperação parlamentar e fortalecer os laços legislativos.

Os dois países também colaboraram em organizações internacionais e fóruns multilaterais. O Chile tem apoiado consistentemente as posições da China em questões internacionais importantes, incluindo o princípio de “Uma Só China”. Em troca, a China apoiou candidaturas do Chile em cenários internacionais e fomentou um senso de apoio mútuo no cenário global. Ambas as nações trabalharam juntas em fóruns como a APEC e as Nações Unidas,defendendo o multilateralismo e o comércio aberto.

Além disso, China e Chile assinaram vários acordos bilaterais que abrangem uma ampla gama de áreas, incluindo defesa, educação, cultura e ciência e tecnologia. A criação da Comissão Mista China-Chile de Ciência e Tecnologia facilitou a colaboração em projetos de pesquisa e iniciativas de inovação. Em 2019, ambos os países comemoraram o 50º aniversário das relações diplomáticas, organizando eventos e intercâmbios culturais, fortalecendo ainda mais os laços entre seus povos.

A participação do Chile na ICR destaca seu compromisso em aprofundar os laços e alinhar-se com a visão da China para a conectividade global. A ICR oferece oportunidades de colaboração no desenvolvimento de infraestrutura, facilitação do comércio e intercâmbio cultural. Ao se alinhar à ICR, o Chile se posiciona como uma porta de entrada para o engajamento chinês na América Latina, aumentando sua importância estratégica na região.

Cultura e tecnologia

A China e o Chile aprofundaram significativamente suarelação por meio da cooperação cultural e tecnológica, indo além dos tradicionais laços econômicos e políticos. Os intercâmbios culturais foram fortalecidos com o estabelecimento de Institutos Confúcio no Chile, que promovem a língua e a cultura chinesas, enquanto a cultura chilena foi apresentada na China por meio de eventos como o “Ano do Chile na China” e a participação em exposições internacionais. As colaborações educacionais incluem acordos governamentais que facilitam intercâmbios acadêmicos, oferecendo bolsas de estudo para estudantes chilenos que desejam estudar na China e oportunidades recíprocas no Chile para estudantes e pesquisadores chineses.

A cooperação tecnológica levou a projetos conjuntos ambiciosos, especialmente na área de astronomia, aproveitando as condições ideais do Chile para a observação astronômica. O Centro Conjunto de Dados Astronômicos China-Chile é um exemplo disso, melhorando as capacidades de ambos os países na pesquisa astrofísica. No setor de tecnologia da informação e comunicação (TIC), a Huawei tem avançado na infraestrutura digital do Chile, estabelecendo um Centro Regional de Inovação ecolaborando no projeto do Cabo de Fibra Óptica Transpacífico, que conectará a América do Sul à Ásia, melhorando a conectividade digital global.

Além disso, a experiência da China em energiasrenováveis apoia as metas de desenvolvimento sustentável do Chile, com investimentos nos setores de energia solar e eólica. A participação em fóruns internacionais, como a China International Import Expo (CIIE), tem facilitado mais intercâmbios e parcerias. De modo geral, essas colaborações culturais e tecnológicas enriqueceram a parceria bilateral, promovendo o entendimento mútuo, impulsionando a inovação e contribuindo para o progresso global, além dos interesses puramente econômicos.

III. Modelo chinês

O sucesso da relação entre a China e o Chile e, por extensão, o envolvimento mais amplo da China com a América Latina, pode ser atribuído à estrutura única da estratégia de desenvolvimento externo da China. Essa estrutura enfatiza o respeito mútuo, a não interferência e o foco na cooperação econômica sem impor condições políticas. Diferente do sistema liberal ocidental, que geralmente vincula a assistência econômica a reformas políticas, considerações sobre direitos humanos e adesão a modelos específicos de governança, a abordagem chinesa oferece uma alternativa atraente para muitos países em desenvolvimento.

Instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial impõem condições rigorosas à sua assistência, exigindo que os países beneficiários implementem reformas econômicas e políticas específicas. Embora essas medidas busquem promover a boa governança e a estabilidade econômica, elas podem limitar a autonomia das nações em desenvolvimento e nem sempre consideram os contextos locais.

Essa abordagem criou o que alguns estudiosos descrevem como controle de monopólio sobre normas e políticas globais, deixando as nações em desenvolvimento com alternativas limitadas. O monopólio, nesse contexto, refere-se à concentração de poder em um pequeno grupo de Estados que controlam as normas globais e limitam os caminhos alternativos de desenvolvimento. O domínio da ordem mundial liberal às vezes forçou os países em desenvolvimento a adotar políticas que priorizam os interesses ocidentais em detrimento dos seus próprios interesses, o que restringiu sua capacidade de buscar estratégias de desenvolvimento adaptadas às suas circunstâncias específicas.

Ao introduzir a competição no cenário global, a China oferece novos paradigmas de desenvolvimento, permitindo que as nações escolham as estratégias que melhor atendam às suas necessidades. O rápido crescimento econômico da China, especialmente sob a liderança de Xi Jinping, redefiniu os paradigmas do desenvolvimento global. Iniciativas como a ICR, o Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura (BAII) e o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) oferecem fontes alternativas de investimento e assistência ao desenvolvimento, sem as condições políticas geralmente impostas pelas instituições ocidentais.

A estratégia de desenvolvimento internacional da China tem três pilares principais. Primeiro, a ênfase na não interferência e no respeito pela soberania permite que os países mantenham autonomia política enquanto participam de parcerias econômicas, em contraste com as tendências intervencionistas da ordem liberal. Ao evitar o envolvimento direto nos assuntos internos das nações parceiras, a China promove relações baseadas no respeito mútuo. Essa abordagem permite que os países mantenham sua autonomia política ao mesmo tempo em que se envolvem em parcerias econômicas, criando um ambiente estável propício ao desenvolvimento.

Em segundo lugar, o modelo de desenvolvimento chinês prioriza investimentos em infraestrutura e parcerias econômicas. Por meio do IFR e de instituições como o BAII, a China fornece financiamento para projetos que impulsionam o crescimento econômico, sem exigir mudanças na política econômica ou impor medidas de austeridade. Esse modelo atrai nações que buscam melhorar sua infraestrutura e capacidade econômica sem as restrições das condições financeiras ocidentais.

Terceiro, a abordagem da China prioriza os direitos coletivos, o desenvolvimento econômico e a estabilidade social. Esse modelo tem ressonância em países que buscam elevar os padrões de vida e reduzir a pobreza sem pressões externas para reformar seus sistemas políticos. Ao focar na prosperidade econômica como base para os direitos humanos, a China oferece um caminho de desenvolvimento que se alinha com as prioridades de muitas nações em desenvolvimento.

O engajamento do Chile com a China demonstra as vantagens dessa estrutura alternativa de desenvolvimento. Por meio de investimentos chineses e parcerias comerciais, o Chile fez progressos significativos em vários setores. A China se tornou o maior parceiro comercial do Chile, com forte comércio em mineração, agricultura e tecnologia. Os investimentos da China em infraestrutura e energia fortaleceram a economia chilena ao promover a diversificação e a modernização.

Além disso, os intercâmbios culturais e tecnológicos, como o estabelecimento de institutos Confúcio e a cooperação em áreas como astronomia e telecomunicações, melhoraram a compreensão cultural e impulsionaram a inovação tecnológica, contribuindo para o desenvolvimento social e a conectividade global do Chile.

O sucesso da relação China-Chile destaca as vantagens da estrutura de desenvolvimento externo da China. Ao oferecer uma alternativa ao sistema liberal ocidental, o modelo chinês permite que países como o Chile busquem estratégias de desenvolvimento alinhadas com seus interesses e prioridades nacionais. Essa abordagem se concentra no benefício mútuo, no respeito à soberania e na cooperação prática, levando a avanços tangíveis na economia, na política, na diplomacia, na cultura e na tecnologia.

A parceria China-Chile serve como um exemplo convincente de como estruturas alternativas de desenvolvimento pode contribuir para o crescimento e a prosperidade nacional. Ao oferecer um modelo que enfatiza a não interferência, o crescimento econômico liderado pelo Estado e o bem-estar coletivo, a China oferece às nações em desenvolvimento um caminho para o progresso que se desvia do paradigma liberal ocidental. Essa estrutura permite que os países mantenham a soberania sobre seus processos de desenvolvimento, adaptem estratégias às suas necessidades específicas e participem de parcerias globais em seus próprios termos.

O sucesso alcançado pelo Chile por meio de seu relacionamento com a China ilustra os possíveis benefícios da adoção de diversos modelos de desenvolvimento. Ele destaca a importância da concorrência no sistema internacional, que estimula a inovação e oferece às nações vários caminhos para atingir seus objetivos. À medida que os países navegam pelas complexidades da globalização, a disponibilidade de estruturas alternativas, como a da China, aumenta sua capacidade de buscar caminhos de desenvolvimento autônomos e sustentáveis.

Em última análise, a relação China-Chile exemplifica como o respeito à soberania nacional, o foco em interesses econômicos mútuos e a promoção de intercâmbios culturais e tecnológicos podem levar a avanços significativos.

Autores:

Juan Pablo Sims é professor da Faculdade de Governo da Universidad del Desarrollo, Chile.

Brice Tseen Fu Lee é PhD pelo Instituto de Relações Internacionais e Assuntos Públicos da Universidade de Fudan, em Shanghai, China.

Yun-Tso Lee é professor da Escola de Governo da Universidad del Desarrollo, no Chile.

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