A deslumbrante porcelana Jun

Cada objeto é único devido ao seu processo de produção e queima

Diz um dito popular chinês que “pilhas de ouro não valem uma única peça de porcelana Jun”, o que demonstra bem o valor dessa arte, procurada com tanto afinco por colecionadores chineses, geração após geração. Ela surgiu na dinastia Tang (618-907) e predominou durante a dinastia de Song (960-1279), quando passou a ser considerada um tesouro do país.

Huizong, imperador Song, ordenou a construção de um forno real em Juntai, a atual Yuzhou, província de Henan, para a produção de objetos de porcelana para o palácio — e é daí que vem o nome da porcelana. Os objetos de porcelana Jun não têm superfícies espalhafatosas; ao contrário, têm um brilho profundo e discreto, que reflete o caráter da nação.

Vaso de porcelana Jun simbolizando a “coexistência pacífica” foi exposto ao público em Yuzhou, Provínca de Henan, especialmente produzido em agosto de 2016 para a 13ª Expo China-ASEAN

O que é mais comentado a respeito da porcelana Jun é a transmutação de seu esmalte, durante o cozimento no forno. Objetos de porcelana feitos com o mesmo esmalte podem exibir tons e padrões muito diferentes no decorrer da queima do objeto. Luzes e ângulos diferentes também acrescentam variações ao aspecto das peças. Além disso, os objetos feitos num mesmo forno não mostram necessariamente a mesma cor de esmalte. Até mesmo uma única peça pode apresentar manchas de diferentes nuances e formatos, o que torna essa porcelana mais mística e encantadora ainda.

A transmutação do esmalte na queima dos objetos de porcelana Jun está associada à sua maneira particular de produção, que utiliza minerais especiais de diferentes cores que deixam muitos vestígios. Na realidade, são vários os fatores que podem ocasionar a mudança de cores na queima de peças de porcelana, como as diferentes texturas e formatos das peças e a espessura da camada de esmalte. Alterações muito pequenas no processo de produção podem afetar a cor final. Até mesmo a posição da peça dentro do forno durante a queima, ou a presença de um grande número de peças no forno, além do tipo de combustível usado, podem desempenhar um papel na criação de cores únicas de porcelana.

Outro aspecto que diferencia as obras de porcelana Jun são as suas “marcas de minhoca”. As peças de porcelana Jun costumam ser cobertas com esmalte grosso e pegajoso. No resfriamento, algumas partes afundadas da superfície ficam preenchidas de esmalte e exibem marcas como as deixadas por uma minhoca na terra após a chuva. É sua marca característica.

Na porcelana Jun, não é necessário desenhar imagens ou aplicar cores sobre o esmalte, ou debaixo ou dentro dele, como ocorre, por exemplo, na porcelana branca e azul, na porcelana decorada famille rose e na porcelana Benjarong. A porcelana Jun exibe um esmalte fluente, com padrões que mudam de maneira aleatória e se formam naturalmente, sem o pré-desenho durante a queima.

O que a torna preciosa é sua raridade. Os sofisticados requisitos técnicos exigidos para queimar as obras de porcelana Jun restringiram muito sua produção. O volátil efeito de cores, afetadas por fatores como temperatura, velocidade de resfriamento, posição da peça no forno, combustível usado na queima, e até mesmo a época do ano e clima, resultam numa taxa extremamente baixa de produtos acabados, com cerca de 70% das peças inutilizadas como sucata.

Em sua paixão pela porcelana Jun, o imperador Huizong tinha a tendência de buscar a perfeição no resultado artístico. Em seu reinado, a fim de conseguir a mudança de cor desejada na queima da porcelana Jun, contratou artesãos selecionados, capazes e talentosos, e não poupava despesas. Além disso, estipulou que apenas 36 peças podiam ser produzidas por ano. Naquela época, toda vez que peças de porcelana Jun iam ser removidas do forno, chamavam-se alguns funcionários para supervisionar o processo. Após a seleção das peças que atendiam ao padrão real, as demais eram destruídas, para evitar que peças de porcelana Jun se difundissem entre as pessoas comuns.

Muito talentoso para as artes, o imperador Huizong não teve a mesma habilidade para governar o país. Quando a arte de fazer porcelana Jun atingiu seu auge na dinastia Song, soldados de Jurchen invadiram a capital Song de Bianjing num ataque massivo e capturaram o imperador Huizong. Foi nessa época que os reais fornos da porcelana Jun pararam de funcionar.

Na década de 1950, especialistas de Yuzhou, após repetidos experimentos, conseguiram finalmente reproduzir a porcelana Jun. No nosso século, esta técnica teve um desenvolvimento adicional e viu surgir novos avanços. Além disso, foram resgatadas soluções como o forno com cama de dupla barreira de fogo e a técnica de queima a lenha.

Incentivada e guiada pelo governo, a arte de confeccionar porcelana Jun experimentou grande impulso e vive uma explosão sem precedentes. Artesãos, combinando técnicas tradicionais com tecnologia moderna, têm produzido obras-primas contemporâneas de porcelana Jun. Os objetos também se tornaram valiosos presentes de Estado para dignitários estrangeiros.

Hoje, as antiguidades dessa porcelana estão principalmente nas coleções reais das dinastias Yuan (1271-1368) e Qing (1616-1911). É realmente raro ver obras da dinastia Song. As três peças abaixo são itens representativos da porcelana Jun que fazem parte do acervo de museus.

Suporte de vaso de porcelana Jun rosa-violeta, com três pés, em formato de flor de castanha d’água, da dinastia Song do Norte (960-1127)

Essa peça faz parte do acervo do Museu do Palácio de Pequim. Seu brilhante esmalte rosa-violeta vem das partículas de cobre aquecidas por uma forte chama redutora. Com suas evidentes marcas de minhoca sobre o esmalte, é uma peça de porcelana Jun de alta classe.

Porcelana Chuji Zun esmaltada em branco-azulado, da dinastia Song

Parte da coleção do Museu de Xangai, a porcelana Jun (recipiente de vinho usado nas cerimônias da realeza na antiga China) tem um ressalto quadrado, chamado chuji em chinês antigo, voltado para as quatro direções. Desde a dinastia Shang (c. 1600 – c. 1100 a.C) até o início da dinastia Song do Norte, o zun era feito de bronze. No reinado do imperador Huizong, a porcelana Jun começou a substituir os bronzes Zun.

Vaso de base alta com esmalte azul-céu, e desenho de máscara animal, da dinastia Yuan

Peça do Museu da Capital, este vaso de porcelana Jun foi desenterrado em Pequim na década de 1960. Com uma abertura em formato de flor e animais ferozes decorando os dois lados de seu bojo, o vaso assenta-se sobre um pedestal com entalhes elaborados, transmitindo uma auspiciosa mensagem de felicidade, boa sorte, riqueza e paz.

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