Cantores Zé Renato e Coco Zhao lançam parceria “Sutil Cintilar”

Música cantada em português e chinês faz alusão ao diálogo entre culturas

Por Lucas Almeida

“Um outro caminho, um novo paladar”, anunciam os primeiros versos da música “Sutil Cintilar”, parceria do cantor brasileiro Zé Renato e do chinês Coco Zhao, lançada no final de agosto. A música, cantada nos dois idiomas, faz alusão à Rota da Seda e abre espaço para um diálogo mais próximo entre a cultura dos dois países.

Zhao se consolidou como um dos principais nomes do jazz na China já no início da carreira, em meados dos anos 90. Ele ouvia cantoras como Billie Holiday desde a infância em discos dos pais e se tornou um fenômeno depois de estudar composição no Conservatório de Música de Xangai, conhecida como a capital chinesa do jazz.

Os portos da cidade já estavam habituados com o jazz desde as primeiras décadas do século XX. Entre os anos de 1920 e 1930, o ritmo começou a ganhar versões com influências de música tradicional do país asiático.

A partir dos anos 1980, o cenário de jazz em Xangai se tornou mais liberal, com a influência das novas gerações. Depois da sua graduação, Zhao integrou esse movimento, em apresentações que chamavam atenção pela sua postura provocadora e sensual, além da mistura entre influências musicais tanto do oriente quanto do ocidente.

Para a revista China Hoje, Zhao relembra que através do jazz, conheceu a música brasileira. Seu primeiro contato foi com a música “Once I Loved”, cantada por Astrud Gilberto, uma versão em inglês de “O Amor em Paz”, de Tom Jobim e Vinícius de Moraes.

“A melodia delicada, as belas harmonias e a refrescante sensação da bossa nova abriram o meu mundo para a música brasileira”, reconta Zhao, que hoje cita nomes como Djavan, João Bosco e Ivan Lins entre os artistas que escuta.

O responsável pela parceria entre Zhao e Zé Renato foi Evandro Menezes de Carvalho, editor executivo chefe da revista China Hoje, professor de direito internacional e coordenador do Centro de Estudos Brasil-China da FGV, que conheceu o cantor chinês após assistir a um show dele em Xangai, no final de 2015.

Cerca de três anos depois, o professor encontrou Zé Renato em uma apresentação do grupo Boca Livre em Recife e assim começou o diálogo, para uma possível colaboração. Nome marcante da música brasileira, Zé construiu uma carreira solo desde os anos 1980, em paralelo aos trabalho com o grupo.

“Eu ficava em uma função de ponte. Passava informações de um para o outro, para que eles se sentissem seguros com o projeto”, conta Carvalho para a revista China Hoje. O professor ainda foi responsável pela ideia de uma composição que mencionasse a Rota da Seda.

“As canções são, invariavelmente, tecidos”, afirma Pedro Luís, que participou da composição da canção. “Quando Zé me envia a melodia e indica a possibilidade de que seria a aproximação entre a cultura das duas nações e suas especificidades, começo a fazer o garimpo de possibilidades de cá e lá e os assuntos e caminhos vão surgindo e sendo lapidados”, ele relembra.

Coco Zhao compartilhou do sentimento, com esperanças de que a composição impulsione a aproximação entre a cultura dos dois países: “Como eu escrevi na canção, não importa de onde você seja, qual idioma fale ou o que você passou. Nossos sentimentos são o mesmo e a música, essa criatura mágica, é capaz de transcender todas as barreiras linguística em uma sensação que não conseguimos compreender”.

O compositor Pedro Luís

Com a versão brasileira, Zhao pôde escrever os versos no idioma chinês. O cantor conta que teve dificuldades na adaptação, devido ao fato das palavras em português poderem contar com múltiplas sílabas, enquanto o chinês é composto por sílabas únicas.

“Para encaixar as letras em chinês na linda melodia de ‘Sutil Cintilar’, eu tive que ajustar algumas notas para serem mais longas ou mais curtas, criando uma similaridade rítmica. Espero que não tenha soado ruim”, ele brinca.

Apesar da distância física e das barreiras linguística, Zé Renato não viu grandes obstáculos na parceria: “A música de Coco contém muito sentimento e leveza, traços que caracterizam também o meu universo artístico, portanto tudo aconteceu de forma orgânica, sem dificuldades”.

A canção ganhou um videoclipe que reúne gravações dos cantores, junto com Rômulo Gomes, responsável pelo baixo acústico, e Pantico Rocha, na bateria e percussão. “A pandemia acabou viabilizando a gravação da música, que ficou muito bem executada, com um baixíssimo custo”, explica Evandro Menezes de Carvalho. “Esse projeto é uma mensagem de esperança, que a gente pode construir uma relação com qualquer país do mundo, de respeito, diálogo e inspiração, através da arte.”

O lançamento ainda deve ser apenas um primeiro passo na parceria entre os dois países. “A minha trajetória tem sido construída com ênfase na diversidade, tentando incorporar, na medida do possível, as interessantes formas de diálogo que poucas expressões artísticas, como a música, são capazes de proporcionar”, afirma Zé Renato. “É um prazer iniciar essa parceria com a música chinesa ao lado de um artista talentoso como Coco Zhao.”

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